terça-feira, 25 de julho de 2017

A falência de um Estado gastador: Justiça custou R$ 175 bi em 2016


A partir do cruzamento de dados e fontes, Correio traça uma radiografia dos gastos do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, que, ao contrário do aperto geral das famílias, continuam esbanjando recursos públicos em detrimento do atendimento à população
A Justiça brasileira custou R$ 175 bilhões ao contribuinte no ano passado, quase 270% a mais que em 2015. O dinheiro veio de empenhos do Ministério do Planejamento, e, segundo o Conselho Federal de Justiça (CNJ), responsável por fiscalizar o Poder Judiciário, é praticamente todo gasto com o salário dos servidores. Há três anos, estudo feito na Universidade Federal do Paraná (UFPR) já apontava o nosso Judiciário como um dos mais caros do mundo, ficando atrás apenas de El Salvador. As despesas estão tão exageradas que o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes as qualificou como parte de um "baguncismo institucional".
"Há um quadro de distorção proporcionado pelo próprio Judiciário, que deu aumentos indiscriminadamente e não freou as regalias. Autoridades viajam a trabalho sempre em assentos da classe executiva, assunto que já foi denunciado em representação ao CNJ. Outro ponto são os penduricalhos, como o auxílio-moradia concedido aos juízes. Não concordo. Isso consome R$ 800 milhões por ano, fora os salários dos magistrados e dos servidores. É um festival de absurdos", disse Gilmar Mendes ao Correio.
Para o ministro, os privilégios são concedidos a quem tem cargos mais altos, e isso aumenta a conta, mas não a qualidade do serviço prestado à comunidade. "Gasta-se muito com juízes e desembargadores, todos parecem participar de uma corrida maluca. E não há estrutura básica para os servidores. No interior, você vê gente recebendo pelos tribunais e trabalhando nas prefeituras".
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Em 2015, o Planejamento empenhou R$ 39,8 bilhões ao Judiciário. Um ano depois, o montante subiu 269,63%, chegando aos R$ 174 bilhões. O CNJ não tem estimativas sobre o quanto foi gasto em 2016, e os números divulgados pela instituição sobre o ano anterior divergem dos enviados pelo Ministério do Planejamento. Em documento elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça, no entanto, há detalhes sobre folha de pagamento dos tribunais e dos órgãos judiciários, que consome 89% do dinheiro que entra nos cofres. Com os servidores, vêm também os benefícios, como carros oficiais, passagens aéreas, diárias, indenizações e gratificações, praticamente nunca detalhadas no Portal da Transparência.
O relatório do CNJ, já realizado sob a supervisão da ministra Cármen Lúcia, calcula a força de trabalho do Poder Judiciário. São 451.497 mil pessoas, entre servidores e terceirizados, dos quais 17.338 são juízes; 278.515, servidores; e 155.644, auxiliares. O documento mostra ainda que a Justiça estadual é a que mais consome dinheiro público, seguida do Trabalho e da Federal. Os tribunais superiores ficam com a segunda menor parte da fatia, correspondente a 4,2% do total.
Os números são elevados, mas a prestação de tutela jurisdicional no Brasil é uma das mais lentas do mundo. Isso se reflete no Estado, visto como um ineficiente prestador de serviços públicos. "A Justiça é caríssima e muito lenta. O serviço que oferece ao povo brasileiro não vale os gastos. É necessário que toda a estrutura seja revista", disse a ministra aposentada Eliana Calmon, primeira mulher a compor o Superior Tribunal de Justiça no país e ex-corregedora do CNJ.
Calmon comparou ainda o custo-benefício entre algumas gamas do Judiciário, como o da Justiça do Trabalho. "Gasta mais dinheiro que a Justiça Federal. Foi feito um cálculo, acho que nunca nem divulgaram, do quanto essa instância devolve para o trabalhador. Não valia o gasto. Seria mais barato o Estado indenizar o cidadão. Ah, e mais rápido também".
Segundo revelou o pesquisador Luciano da Ros, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), no estudo chamado O Custo da Justiça no Brasil, de 2014, o Brasil gastava, à época, 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) bancando o Judiciário. Ele comparou as cifras com as de outros países, como os Estados Unidos (0,14%), a Itália (0,19%) e a Alemanha (0,32%). Foi a primeira pesquisa do gênero realizada no Brasil. 
Por Bernardo Bittar, para o Correio Braziliense


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