quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Para auferir coisa alguma


Os organismos internacionais freqüentemente se surpreendem com o volume de recursos que o Brasil aloca em seus programas de desenvolvimento. É uma quantidade de recursos orçamentários e financeiros vultosos, expressivos, compatíveis com a dimensão econômica do país, sempre oscilando em torno das dez mais substantivas economias do mundo.

Mas se surpreendem muito mais quando verificam que parte considerável dos investimentos realizados se pulverizam, desmancham-se no ar, levando a resultados efêmeros, ineficazes, pífios e medíocres.

Dentre as causas dos reiterados fracassos, a que se destaca - por indecorosa e aviltante - é a corrupção, que carreia para o aterro sanitário o esforço de gerações, de milhões e milhões de brasileiros. E a corrupção, todos sabem, tem como nutriente preferencial a vasta teia de labirintos onde adquire músculos de aço a gigantesca burocracia estatal. Rotinas operacionais, fluxos administrativos, procedimentos gerenciais, um marco regulatório que refuga a livre iniciativa, o empreendedorismo e o crescimento sustentável, além da cultura corporativa originam o miasma nauseabundo de que se sorvem as negociatas, o tráfico de influência, o clientelismo e a troca de favores.

E mesmo a corrupção decorre também de problemas de administração. Para dirigir com eficácia qualquer empreendimento é preciso assegurar que a arte da gestão esteja sob completo domínio. É necessário se apropriar das ferramentas mais adequadas, se cercar dos profissionais mais qualificados, estabelecer metas e objetivos claros e exeqüíveis, monitorar e retro-alimentar o processo com zelo e persistência férrea, vontade inquebrantável. Não basta querer, desejar, é necessário saber.

Todavia, embriagado pelo viés perverso do ‘jeitinho brasileiro’ quem lá vai querer saber de compromissos, de metas, de controle e avaliação, de se comprometer com qualidade e cobrança de resultados? “Deixa a vida me levar”, não é a cantiga da vez, a cantilena que embala o sonho de quase todos?

Em todos os níveis do ensino, os investimentos governamentais têm sido expressivos e crescentes. O problema é que a corrupção e a má gestão acompanham o ritmo.

No ensino superior, por exemplo, efetuando as correções decorrentes de perdas inflacionárias, os investimentos – apenas nas universidades públicas – saltaram de 7,0 bilhões de reais em 1997 para 9,9 bilhões em 2.006. Em qualquer lugar do mundo essa quantia não é nada desprezível. É muito dinheiro. Nos países desenvolvidos, investimentos desse porte traduzem-se em riqueza social porque a corrupção e a má gestão, lá, são enquadradas e os responsáveis obrigados a passar longas temporadas nos presídios federais, vendo o sol nascer quadrado.

O universitário brasileiro demanda 2,5 vezes mais investimentos dos que seus colegas dos países desenvolvidos. Enquanto no Brasil, o custo de um estudante da universidade pública equivale à renda anual média do brasileiro, nos países desenvolvidos, a média com dificuldades chega a 40%. Tomando as regras da proporcionalidade é fácil perceber que alguém nesta história está muito errado.

Nossos problemas estão longe, muito longe da tão propalada insuficiência de investimentos. Tem quase tudo a ver com leniência e brandura com que são tratadas a corrupção e a má gestão dos recursos públicos.

É evidente que os investimentos deverão continuar crescendo para assegurar qualidade à educação brasileira. Mas sem lidar com a questão da súcia de gatunos que assaca contra os cofres públicos, por mais que se invista, os resultados sempre estarão muito aquém do efetivamente necessário. É quando se mobiliza o trabalho, esforço e o suor de várias gerações para auferir coisa alguma.

Antônio Carlos dos Santos é engenheiro, escritor, criador da metodologia de planejamento estratégico Quasar K+ e da tecnologia de produção de teatro popular de bonecos Mané Beiçudo. acs@ueg.br